Fonte: STJ – Superior Tribunal de Justiça
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão unânime, negou provimento ao recurso especial de uma operadora de plano de saúde que não quis pagar pela substituição de prótese para um paciente amputado. De acordo com o colegiado, a negativa do plano é abusiva, pois foi documentado por laudo médico que a necessidade da nova prótese é decorrente do ato cirúrgico anterior.
De acordo com o relatório médico, a primeira prótese não se mostrou adequada para o restabelecimento do paciente e pode até mesmo provocar uma nova amputação.
Após um acidente de moto, o paciente teve a perna esquerda amputada, na altura da coxa, e precisou colocar uma prótese mecânica. O dispositivo deveria ajudá-lo na locomoção, mas, depois de algum tempo, começou a trazer problemas, como dores intensas e escaras – com o risco de exigir nova intervenção cirúrgica, inclusive.
O paciente recebeu de seu médico a indicação de troca da prótese por outra mais adequada, no valor de R$ 170 mil, que atenderia melhor suas necessidades, mas a operadora do plano se negou a pagar pela substituição, alegando que o procedimento não estava relacionado ao ato cirúrgico, nem previsto no contrato.
O Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a sentença que determinou o fornecimento da prótese.
Finalidade do contrato
A relatora do recurso da operadora na Terceira Turma, ministra Nancy Andrighi, destacou que a questão discutida nos autos envolve a aplicação do artigo 10, inciso VII, da Lei dos Planos de Saúde, o qual exclui do plano de referência o fornecimento de próteses, órteses e acessórios não ligados ao ato cirúrgico.
Apesar de reconhecer a existência de precedentes no STJ com uma interpretação restritiva do que seria a prótese ligada ao ato cirúrgico, a ministra assinalou que a solução do caso deve levar em conta a finalidade do contrato de assistência à saúde.
Para ela, se é verdade que o sistema privado de saúde suplementar depende do equilíbrio econômico-financeiro dos planos, não menos importante é o próprio objeto contratual, ou seja, a prestação continuada de serviços ou a cobertura de custos “com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde” – como previsto no artigo 1º, I, da Lei 9.656/1998.
Além disso – acrescentou a relatora –, é o médico, e não a operadora do plano, quem deve indicar o melhor tratamento para o paciente.
Expectativa legítima
Nancy Andrighi afirmou que “é legítima a expectativa do consumidor de que, uma vez prevista no contrato a cobertura para determinada patologia, nela esteja incluído o custeio dos materiais e instrumentos necessários à efetiva realização do tratamento prescrito”.
Em seu voto, a ministra ressaltou a conclusão dos profissionais de saúde de que a prótese não possui fins estéticos, mas funcionais, e permitirá melhorar a qualidade de vida do paciente.
“Como a primeira prótese não é mais adequada para o restabelecimento da amputação sofrida pelo recorrido, o fornecimento de outra prótese, de acordo com a indicação de laudo médico, que atenda o estado de saúde do consumidor, está inserido, por decorrência natural, no ato cirúrgico de sua amputação”, declarou a relatora.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.850.800 – SP (2019/0261707-4)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ASSOCIAÇÃO DE BENEFICÊNCIA E FILANTROPIA SÃO CRISTÓVÃO
ADVOGADOS : JOSE LUIZ TORO DA SILVA – SP076996
VANIA DE ARAUJO LIMA TORO DA SILVA – SP181164
EDY GONÇALVES PEREIRA – SP167404
EMERSON MOISÉS DANTAS DE MEDEIROS E OUTRO(S) – SP275295
RECORRIDO : EDUARDO DA SILVA
ADVOGADO : CÍNTIA AMÂNCIO ROCHA – SP249216
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. SAÚDE SUPLEMENTAR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.
PLANOS DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE PRÓTESES. ATO CIRÚRGICO DE
AMPUTAÇÃO. COLOCAÇÃO DE PRÓTESE INDISPENSÁVEL AO TRATAMENTO
DO BENEFICIÁRIO. COBERTURA DEVIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
RECURSAIS. MAJORAÇÃO.
1. Ação ajuizada em 3/1/16. Recurso especial interposto em 8/2/19. Autos
conclusos ao gabinete em 18/10/19. Julgamento: CPC/15.
2. O propósito recursal consiste em dizer da interpretação do art. 10, VII, da
Lei 9.656/98, quando o beneficiário do plano de saúde pretende o
fornecimento de prótese como decorrência de cirurgia de amputação de
membro inferior. Isto é, se a operadora de plano de saúde está obrigada a
fornecer prótese substitutiva de membro amputado em cirurgia.
3. É legítima a expectativa do consumidor de que, uma vez prevista no
contrato a cobertura para determinada patologia, nela esteja incluído o
custeio dos materiais e instrumentos necessários à efetiva realização do
tratamento prescrito.
4. Na hipótese, como a primeira prótese não é mais adequada para o
restabelecimento da amputação sofrida pelo recorrido, o fornecimento de
outra prótese, de acordo com a indicação de laudo médico, que atenda o
estado de saúde do consumidor, está inserido, por decorrência natural, no
ato cirúrgico de sua amputação.
5. Logo, especificamente na situação em que se encontra o recorrido, é
abusiva a negativa de substituição da prótese, ante o risco devidamente
documentado por laudo médico de uma nova amputação, em frustração do
seu pleno restabelecimento saudável.
6. Recurso especial conhecido e não provido, com majoração de honorários.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao
recurso especial, com majoração de honorários, nos termos do voto da Sra. Ministra
Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco
Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 04 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora